Conclusão é de pesquisa da Unicamp que analisou dados de 287.719 estudantes que participaram do Saeb (exame federal)
Resultado foi o mesmo em todas as séries e entre pobres e ricos; uma das hipóteses é de que o aluno diminua as horas de estudo
Piero Bonavita, 16, costumava ficar em frente ao computador seis horas por dia. Nas férias, chegava a 12. Em boa parte das vezes, a máquina era ligada para fazer pesquisas pedidas pela escola. Rapidamente, porém, seus colegas o chamavam para conversas on-line. "A lição ia para o espaço", conta o aluno do colégio São Luís, um dos mais conceituados de São Paulo. O excesso de horas no computador trouxe um resultado negativo. Suas notas caíram, principalmente em matemática e química (ambas nota 3,5). Com o susto, ele passou a ficar menos tempo na máquina, a partir da metade de 2007.
A situação de Piero pode ilustrar uma pesquisa recém-concluída pela Unicamp, que mostrou que o uso intensivo do computador está diretamente ligado à queda das notas dos estudantes do ensino básico.
A constatação foi válida para todas as séries analisadas (4ª e 8ª séries do fundamental e 3º ano do médio), tanto para alunos ricos quanto para pobres. A pesquisa analisou dados de 287.719 estudantes que participaram do Saeb (exame aplicado pelo governo federal) em 2001 -apesar da data, os autores dizem que dificilmente teria ocorrido uma mudança significativa do padrão desde então.
Entre os alunos da 4ª série, de melhores condições financeiras, as menores médias em matemática (225.1) foram dos que disseram usar "sempre" o computador para suas lições - o estudante também responde a um questionário na prova.
As maiores médias foram dos alunos que usam a máquina "raramente" (246.5). Mas até mesmo os que "nunca" o fazem tiveram nota melhor (237.1) do que os que usam intensamente.
A mesma lógica foi verificada nas outras séries e nas outras camadas sociais. Segundo os autores da pesquisa, uma possível explicação é que os alunos que usam intensamente o computador dedicam menos horas aos estudos.
Também pode contribuir o fato de os usuários intensivos do computador terem amplo domínio de ferramentas de correção ortográfica e cálculos. Assim, não se estimulariam na aprendizagem dessas áreas, ao menos no formato escolar.
Colégio de São Paulo com as melhores notas no Enem (exame do ensino médio), o Vértice já detectou que o uso intenso do computador é um problema."Quando analisamos os casos dos estudantes que estão com um desempenho ruim, quase sempre vemos que isso está ligado ao excesso de computador", disse Adilson Garcia, diretor do colégio. "Muitos ficam sonolentos a aula inteira."
Colega de Piero no São Luís, Alexandre Mesquita, 15, conta que desliga o MSN na hora de estudar. Aluno de boas notas, ele diz que usa o computador "para tudo", até jogar. "Mas tem que conciliar."
Informatização
Os pesquisadores da Unicamp decidiram analisar o impacto das políticas públicas para oferecer acesso ao computador aos estudantes. A última é referente ao governo federal, que pretende comprar 150 mil laptops para os alunos (o MEC não se pronunciou sobre os dados).
Segundo os autores do estudo, a decisão de investir em computadores foi feita sem embasamento científico. "Parece óbvio agora que a informatização não trará automaticamente benefícios no desempenho escolar", disse Jacques Wainer, um dos autores.
"Para mim, a discussão deve ser feita em "como" se deve usar o computador e não "se" é preciso usá-lo", afirmou Marcelo Neri, da FGV, que fez em 2003 um estudo chamado "Mapa da Exclusão Digital", que defendeu a ampliação do acesso da informática aos alunos.
segunda-feira, 18 de agosto de 2008
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